quinta-feira, 13 de agosto de 2015

A LUTA VALE A PENA – Juares Pires de Souza

Foto: Stefan Schmeling  

Foto: Stefan Schmeling

Essa conclusão é de Juares Pires de Souza, há quase 20 anos combatendo uma leucemia mielóide crônica. Hoje, negativado, joga futebol, tem tempo para a netinha Maria Eduarda e é vice-presidente da ABRALE.
Daqui a pouco serão duas décadas desde que Juares Pires de Sousa levou seu primeiro grande susto. Foi quando soube que tinha leucemia mieloide crônica (LMC), bateu o carro em uma árvore e quase morreu. Foram anos de luta até poder brincar com a neta Maria Eduarda, hoje com 4 anos – seu “chiclete”, como diz o funcionário da Unicamp aposentado e vice-presidente da ABRALE.
Foi por ter emagrecido 6 quilos e também por ter algum conhecimento (trabalhava na Faculdade de Ciências Médicas da universidade, em Campinas, desde os 15 anos, quando entrou como office boy) que Juares decidiu por conta própria ir atrás de um exame de sangue por imaginar que estivesse com anemia. Com o resultado na mão, não gostou do que leu. Na hora do almoço, no refeitório, decidiu mostrar os papéis para um médico amigo. Nem chegaram a comer: dali seguiram para fazer uma biópsia. Mais três horas e o diagnóstico estava fechado. “Eu teria um tempo entre seis meses e dois anos, em média. Estava com dois filhos pequenos, de 4 e 9 anos… Nem sei como bati o carro na árvore. Tinha saído do pronto-socorro e para lá me levaram de novo. Foi bem feio. Quase morri”, conta Juares, que também era praticante e professor de artes marciais. Em centros de referência, como Curitiba e Porto Alegre, Juares confirmou o diagnóstico, retornando para a biblioteca da Unicamp para estudar tudo sobre a LMC, uma doença genética. Precisava de um doador de medula e foi cadastrado no Hospital das Clínicas, em São Paulo, onde a relação de doadores tinha apenas em torno de cem nomes, nenhum compatível. Juares diz que hoje, no Brasil, há cerca de 1,2 milhão de doadores inscritos; no mundo, esse número sobe para 6 milhões. Na época, 1993, o caminho seria fazer o cadastro internacional e arcar com custos bem altos. Numa segunda fase, seria preciso pagar exames mais apurados de tipagem de prováveis doadores, “cada um deles custando 500, 600, 700 dólares”. Mas Juares não tinha dinheiro. Familiares e amigos foram para as ruas em Campinas, fizeram campanhas de arrecadação. Em 1995, com o tempo correndo contra (já estava no prazo médio de dois anos para entrar na chamada fase aguda da LMC), outro choque, tão grande quanto os anteriores – só que, dessa vez, um choque de felicidade: “Ligaram para minha casa para informar que alguém com dinheiro abraçaria a minha causa e que, a partir dali, eu não precisaria me preocupar com os custos do tratamento. E assim foi. Ele não quer ser identificado. Posso dizer que é abençoado – e muito humilde”. Juares chegou a ir em 1996 para a Universidade de Massachusetts, em Boston, com a mulher, Odila, atrás de um transplante a partir de um provável doador encontrado. Mas lá descobriu simplesmente que o exame de sua própria tipagem de sangue estava errado. Sua medula, na verdade, não tinha compatibilidade com a daquele doador. Nesse tempo todo, a busca tinha sido por tipagens que não eram compatíveis. “Eu estava cada vez mais preocupado com o prazo antes de entrar na fase aguda da doença”.
Juares corria atrás de tudo, a família ficava “meio abandonada”. “Minha filha, então com 10 anos, parecia ter 20. Eu tinha de pagar conta de água, luz, telefone… Mas a cura de uma doença também passa pela nossa cabeça. Acho que 50%. Porque se a pessoa se fecha, se entrega… Eu, por exemplo, não estaria aqui, agora, com minha netinha de 4 anos”. Em março de 1996, foi internado para colher a própria medula, que seria congelada para fazer o autotransplante. Mas, sem defesa, com zero de imunidade, Juares pegou um fungo que atacou todos os órgãos internos e a pele. A doença é rara, e os dois pacientes de que se tinha notícia haviam morrido. Foram oito meses de tratamento com remédios importados, porque os rins não suportavam mais as drogas. “Até o fungo sair do coração, dos pulmões, dos rins, da pele. Ainda ficou no baço. Até pensaram em tirar o órgão.”
Como paciente, atingiu o peso de 30 quilos. Os médicos chegaram a comunicar a Odila que ele não passaria de determinada noite. Mas Juares passou por aquela noite e, às 7 horas da manhã seguinte, sentou-se na cama e disse que queria tomar banho. “Foi aquela correria, fio para todo lado, aquele chororô geral!”
Nesse tempo todo no hospital, vinha lutando mentalmente. “Eu tinha me dedicado à busca da cura, mantinha o pensamento firme. Posso dizer que naquela noite tive uma experiência de luta mesmo, para não ir, como se alguém me puxasse para fora do corpo e outro para dentro. Minha mulher disse que, na véspera, quando foi à capela, conversou com Jesus e também sentiu que eu não iria morrer, como o médico havia dito. Pessoas chegaram para orar por mim – depois soube que rezaram a noite toda”. A disciplina, o autocontrole, o pensamento firme e mesmo a preparação física adquirida com as artes marciais ajudaram, diz Juares, que também fala da fé em Deus: “Há sempre uma esperança”. Tinha a medula congelada, sua “âncora” – que depois se viu não estar com o fungo. Juares prosseguiu tomando os remédios importados, mais caros. Em 1999, passou a sentir “uma dorzinha”. Em 2000, era muita dor nos ossos, de gritar, e o médico constatou que a doença de Juares tinha “agudizado”. Fez a proposta para que seu paciente tentasse o STI – com o remédio Glivec, que em 2000 ainda vinha dos Estados Unidos. “Ele é chamado ‘medicamento inteligente’ porque vai direto ao alvo: no caso, o cromossoma Philadelphia. É como tiro certo”. O medicamento deu resultado. Em 2002, Juares estava negativado. E não parou de tomar o Glivec, um por dia “e sempre com o estômago cheio, para não ter náusea”, como descobriu. Faz exames periódicos. Em 2002, foi um dos fundadores da ABRALE. Voltou ao futebol. Aposentado, tem tempo para Maria Eduarda. “E há gente que pensa em se suicidar! Pois eu digo que a luta vale a pena”.
Créditos: Revista ABRALE – http://www.abrale.org.br
Fonte: http://www.combateaocancer.com/a-luta-vale-a-pena-juares-pires-de-souza/

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