Entre 10 e 20 por cento dos idosos relatam alguma diminuição na capacidade cognitiva, mesmo que suave. Se considerarmos que problemas cognitivos ocorrem quando a pessoa tem dificuldades no processamento de informações, de raciocínio ou memória, esta é uma questão que aflige boa parte da humanidade. Efeitos colaterais de medicamentos ou tratamentos, por exemplo, podem provocar alterações de comportamento ou perda de habilidades; mas, como encaramos a situação como um estado transitório, não nos preocupamos em como lidar com esse déficit a longo prazo. No entanto, na velhice, esse dano – mesmo que seja leve – fará parte do dia a dia. Atualmente há cerca de 47 milhões vivendo com demência, a um custo global que, em 2015, estava estimado em 818 bilhões de dólares. É por isso que pesquisadores elegeram uma nova frente de batalha: como estimular e garantir, a um custo acessível, a reserva cognitiva de cada indivíduo, de forma a protegê-lo por mais tempo deste tipo de complicação associada ao envelhecimento?

Em primeiro lugar, como se acumula uma reserva cognitiva? Dá para fazer o paralelo com uma poupança: tem que ser o resultado de toda uma vida! As pesquisas apontam que o cérebro se alimenta de experiências: quanto mais complexas, mais estimulam conexões neurais. Trocando em miúdos: é preciso sair da zona de conforto, buscar desafios, aprender continuamente – queimar a mufa! Pessoas com esse tipo de “capital” têm perdas menores e são capazes de achar estratégias e formas alternativas de raciocínio. Por isso é tão importante que, desde a mais tenra infância, todos sejam estimulados, mas também é possível atingir novos patamares de reserva cognitiva na maturidade. É o que vai garantir indivíduos vivendo com autonomia em suas comunidades.

Como está na ordem do dia, esse é o tema de dois eventos internacionais que ocorrem este ano. O primeiro acontece na mesma data do 10º Congresso Paulista de Geriatria e Gerontologia, cuja abertura será nesta quinta-feira em São Paulo. Será em North Bethesda (Maryland, EUA), onde estudiosos vão discutir como atingir uma resiliência capaz de deter os danos causados pelo tempo: formas de estimular a memória, o papel da genética, a importância de exercícios físicos. Em dezembro, o encontro de médicos e cientistas será em Copenhague, capitaneado pela International Federation on Ageing.

São iniciativas que poderão resultar em ações efetivas para aproveitarmos o bônus da longevidade. A Organização Mundial da Saúde já vem chamando a atenção para a necessidade de investir na (re)capacitação dos idosos, para que recuperem sua independência e autonomia. Em inglês, chama-se reablement, ou seja, tornar o indivíduo novamente capaz, dentro de suas possibilidades. Não se trata da reabilitação que é feita depois de um trauma, e sim de uma adaptação às limitações impostas pela idade. De acordo com essa perspectiva, as pessoas mais velhas são encorajadas a focar no que valorizam e sabem/podem fazer com segurança, em vez de só pensar no que não podem mais realizar. A tecnologia e o design são determinantes para resgatar ou aumentar a capacidade funcional. Recuperar habilidades representa uma enorme vitória para um idoso – e vai alimentar sua reserva cognitiva.