Vírus do atual surto de febre amarela tem mutação genética inédita, diz Fiocruz
Segundo pesquisadores, não há registro anterior dessas alterações na literatura científica mundial. No entanto, mudanças genéticas não tiram eficácia das vacinas disponíveis.
Pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) finalizaram o
sequenciamento completo do genoma do vírus responsável pelo atual surto
de febre amarela no país. A partir dessa análise, eles encontraram
variações inéditas em algumas de suas sequências genéticas. Não há
registro anterior dessas mutações na literatura científica mundial, de
acordo com a instituição.
A equipe de cientistas informa, no entanto, que a vacina usada
atualmente protege contra diferentes genótipos do vírus, incluindo o sul
americano e o africano, e que as alterações detectadas no estudo não
tiram a eficácia de quem tomou uma dose.
"A vacina vai proteger certamente. Um exemplo disso é que em qualquer
lugar do mundo que você tem variantes da febre amarela, a vacina protege
com a mesma eficácia. A princípio não muda nada", disse uma das
pesquisadoras, Myrna Bonaldo.
Esse é o maior surto de febre amarela das últimas décadas. O último
boletim do Ministério da Saúde confirmou 756 casos no país, com 259
mortes devido à infecção. Os casos continuam silvestres, com infecções
em regiões de mata e/ou rurais. A doença é transmitida pelos mosquitos
Sabethes e Haemagogus.
O sequenciamento
Desde o aumento de casos no Brasil, a Fiocruz fez os primeiros
sequenciamentos do vírus. Foram utilizadas duas amostras de macacos
bugios do Espírito Santo, mortos em fevereiro de 2017. Os resultados
foram publicados na revista científica "Memórias do Instituto Oswaldo
Cruz".
“Os macacos bugios são especialmente importantes nas investigações
sobre a febre amarela por serem considerados 'sentinelas': como são
muito vulneráveis ao vírus, estão entre os primeiros a morrer quando
afetados pela doença. Além disso, estes animais amplificam
eficientemente o vírus em seu organismo”, descreve Ricardo Lourenço, que
é veterinário e entomologista.
Um resultado inicial apontou que esse vírus da febre amarela pertence
ao subtipo genético conhecido como linhagem Sul Americana 1E, que atua
no Brasil desde 2008. No entanto, com o final da análise completa, os
cientistas conseguiram detectar as variações genéticas, que estão
associadas a proteínas envolvidas na replicação viral.
De acordo com os pesquisadores, os impactos da descoberta para a saúde
pública ainda precisam ser investigados e apontam a necessidade de que
mais amostras sejam sequenciadas, relativas a outros lugares do Brasil e
com coletas em humanos, macacos e mosquitos. Novos resultados deverão
ser apresentados nas próximas semanas.
Os resultados da pesquisa foram encaminhados pela presidência da
Fiocruz ao Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis, do
Ministério da Saúde. De acordo com Bonaldo, os resultados também foram
encaminhados para a comunidade internacional, incluindo Itália, Estados
Unidos e Inglaterra.
A instituição informa, adicionalmente, que outros dados ainda não
publicados apontam os mesmos resultados para a análise de mosquitos
coletados no Espírito Santo e para um macaco morto no Rio de Janeiro.
A fundação diz, ainda, que o estudo "partiu de uma constatação que vem
ganhando cada vez mais espaço". Segundo eles, "a atual situação de febre
amarela tem lacunas de entendimento sobre sua dinâmica de dispersão."
Hipóteses de mutação
Segundo Bonaldo, uma possibilidade para a mutação ter ocorrido é a
capacidade do vírus se modificar geneticamente com frequência (não tanto
como o da gripe), e também devido à baixa cobertura vacinal antes do
surto na região do Rio de Janeiro e Espírito Santo.
A pesquisadora também detalhou como serão os próximos passos do estudo e
destacou que ele serve para conhecer a capacidade circulação do vírus
no país.
"O estudo dá ferramentas preciosas para fazer uma melhor vigilância
sanitária e prever piores casos, além de saber que regiões do Brasil
podem ser priorizadas na hora de uma vacinação", disse.
A partir de agora, a equipe irá estudar o vírus em laboratório e
comparar o tipos anteriores ao surto atual. Também tentarão estabelecer
se esse caso pode ser mais agressivo ou não.
Bonaldo disse que os pesquisadores estão com mosquitos selvagens e
urbanos, uma busca por entender se eles possuem o mesmo potencial de
infecção.
"Vamos poder conhecer um pouco mais da biologia do vírus", afirmou.
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