segunda-feira, 25 de julho de 2016

São Paulo tem 800 mandados obrigando a distribuir 'pílula do câncer'

Secretário diz que situação é 'enlouquecida' e que substância servirá apenas para testes

Cápsulas de fosfoetanolamina: mandados judiciais podem inviabilizar testes de eficácia Foto: CECILIA BASTOS /USP Imagem / Cecilia Bastos /USP Imagem 

Cápsulas de fosfoetanolamina: mandados judiciais podem inviabilizar testes de eficácia - CECILIA BASTOS /USP Imagem / Cecilia Bastos /USP Imagem

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SÃO PAULO – Às vésperas de começar a realizar testes com a fosfoetanolamina sintética, conhecida como “pílula do câncer”, o governo de São Paulo já recebeu 800 mandados expedidos pela Justiça determinando a distribuição da substância a pacientes com a doença. De acordo com o secretário estadual de Saúde, David Uip, isso poderia até mesmo inviabilizar as pesquisas para verificar a eficácia do composto químico, que jamais foi testado em humanos.

A fosfoetanolamina que será utilizada nos testes foi sintetizada e entregue pelo laboratório PDT Pharma, em Cravinhos, interior de São Paulo, à Fundação para o Remédio Popular (Furp) há 15 dias. A substância foi então encapsulada e encaminhada ao Instituto do Câncer de São Paulo (Icesp), que comandará os testes com a fórmula, criada nos anos 90 por um pesquisador do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos. 
 
O secretário de Saúde disse que está esperando um aval da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Conselho Nacional de Saúde (Conep) para o início dos testes. Mas Uip demonstra preocupação com a quantidade de liminares obrigando o governo estadual a distribuir o estoque de fosfoetanolamina adquirido com o único objetivo de realizar os estudos.

— Isso é absolutamente descabido e enlouquecido, porque o que nós encapsulamos é para protocolo, não para distribuição. Se tirar a pílula do Icesp, não teremos como fazer a pesquisa. O compromisso do estado é comprar o número necessário de pílulas para cumprir o protocolo. Não vamos comercializar, mesmo porque há um pedido de patente do pesquisador — explica o secretário, sem esclarecer se vai ou não cumprir as ordens judiciais.

Não é a primeira vez que a Justiça determina a distribuição do composto químico, que, mesmo antes de ser submetido a testes adequados, ficou conhecido devido a relatos não comprovados de pacientes dando conta de que a pílula reduziu seus tumores.

A substância vinha sendo distribuída informalmente por funcionários da USP em São Carlos até junho de 2014, quando a universidade publicou uma portaria interrompendo o repasse. Em meados do ano passado, uma paciente do Rio conseguiu da Justiça autorização para obter o composto químico. Logo depois, centenas de outros pacientes obtiveram liminares obrigando a USP a entregar a fosfoetanolamina. A Justiça, porem, voltou atrás, proibindo a distribuição.

No início deste ano, o governo federal sancionou uma lei aprovada pelo Congresso Nacional que autorizava a distribuição da "pílula do câncer" mesmo antes de estudos adequados sobre a sua eficácia, o que foi duramente criticado pela comunidade médica e científica. A lei, porém, foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em maio.

Testes em andamento com a fosfoetanolamina, financiados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e conduzidos na Universidade Federal do Ceará (UFC), já apresentaram resultados negativos. Segundo estes trabalhos, o composto não demonstrou eficácia na redução de tumores em roedores criados em laboratório.

Ainda são necessários, porém, exames clínicos para determinar os efeitos da pílula.


Em fevereiro deste ano, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, anunciou que a substância seria sintetizada para testes no tratamento do câncer pelo laboratório PDT Pharma. Na época, ele explicou que seriam avaliados, inicialmente, dez pacientes para determinar a segurança da droga.

Segundo Uip, a concentração de fosfoetanolamina entregue à Furp era diferente da que estava prevista. Por conta disso, segue explicando o secretário, o inventor da fórmula, o professor de Química aposentado Gilberto Chierice, da USP de São Carlos, precisou assinar um termo de aceitabilidade, “entendendo que aquilo (diferença na concentração) era pertinente”:

— A última notícia que tenho, que é da segunda-feira passada, é que estavam analisando esse aditivo no protocolo. Assim que o Conep liberar, o teste estará pronto para começar. Chegou, é no dia seguinte — diz Uip.

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