segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Vacinação de emergência tenta conter avanço da febre amarela na África

14 milhões serão imunizados. Temor é que epidemia se torne global, pois estoques de vacina estão acabando

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Campanha de vacinação pretende imunizar 14 milhões de pessoas até o início da estação chuvosa, em setembro - OMS/K. Nishino


RIO — Para conter o avanço da epidemia febre amarela que já infectou mais de 6 mil pessoas em Angola e na República Democrática do Congo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) está coordenando uma das maiores campanhas de vacinação já realizadas no mundo. Por causa da escassez de vacinas, as doses recomendadas foram reduzidas para um quinto do normal, suficiente para imunização por apenas 12 meses.

Com a baixa nos estoques globais, o temor é que a doença se espalhe por outros países e se transforme numa pandemia.

Em trabalho conjunto com os ministérios da Saúde dos dos países, com apoio de 56 parceiros globais, a campanha pretende vacinar mais de 14 milhões de pessoas, em 8 mil postos, num período de tempo curtíssimo. Entre os parceiros está o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos, que doou parte das vacinas. Normalmente, campanhas de vacinação desta envergadura duram entre 3 e 6 meses, mas nesta a corrida é contra o tempo, já que a estação chuvosa começa em setembro, trazendo com ela os mosquitos vetores da doença.

— Para vacinar quase 8 milhões de pessoas em Kinshasa num curto período, cada equipe terá que vacinar centenas de pessoas por dia — disse William Perea, coordenador da Unidade de Controle de Doenças Epidêmicas da OMS. — Proteger o máximo de pessoas possível está no centro desta estratégia. Com suprimentos limitados, nós precisamos usar essas vacinas com muito cuidado.
 
Parte das vacinas foi doada pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos - HANDOUT / REUTERS

De acordo com os últimos relatórios da OMS, a febre amarela já matou 369 pessoas em Angola e 16, na República Democrática do Congo. Os números continuam crescendo, apesar de campanhas anteriores que já imunizaram mais de 13 milhões de pessoas em Angola, e 3 milhões na República Democrática do Congo.

Apesar disso, a OMS identificou áreas consideradas de alto risco, como Kinshasa, capital da República Democrática do Congo, e a fronteira entre os dois países, que se estende por 2.646 quilômetros.

A campanha vai envolver 41 mil funcionários e voluntários, que receberão 17,3 milhões de seringas com a medicação. Mais de 500 veículos serão usados para o transporte de pessoas e suprimentos, que serão espalhados por mais de 8 mil pontos de vacinação.

— A quantidade de seringas necessária não estava disponível no mercado, então fizemos uma encomenda especial para os fabricantes — disse Guillaume Queyras, responsável pela logística da OMS. — O fornecimento de seringas normalmente demora mais de 2 meses. Mas por causa da situação emergencial, os fabricantes trabalharam conosco para acelerar a produção e entregar os suprimentos a tempo.

ESTOQUES DE VACINAS NO FIM
Outro problema enfrentado pela campanha é a escassez de vacinas. Os estoques de emergência foram usados na campanha anterior, que imunizou 16 milhões de pessoas, a maior parte em Angola. Por esse motivo, a OMS está adotando as doses fracionadas, que garantem imunização por cerca de 12 meses, contra os dez anos da dosagem normal. As vacinas distribuídas em Kinshasa foram doadas pelo governo brasileiro, e produzidas no Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos, no Rio de Janeiro.

No mundo, a OMS trabalha com quatro fornecedores. Além da brasileira Bio-Manguinhos, a francesa Sanofi, o senegalês Institut Pasteur e o russo Chumakov Institute produzem vacinas contra a febre amarela, com capacidade anual entre 70 milhões de 80 milhões de doses, volume considerado insuficiente para cobrir a demanda global.

Aumentar a produção é um desafio, pois ela depende do fornecimento de ovos de um tipo especial de galinha, modificada para ser livre de um patógeno específico. Cada ovo produz entre 100 e 300 doses da vacina, mas não existem criadouros dessa galinha em larga escala.
 
A campanha pretende imunizar 8 milhões de pessoas na capital da República Democrática do Congo, Kinshasa - KENNY KATOMBE / REUTERS
  De acordo com a ONG internacional Save the Children, que participa da campanha, o estoque de emergência tem apenas 5 milhões de doses da vacina, que devem ser usadas por completo nesta campanha. A maior preocupação é com Kinshasa, cidade com mais de 10 milhões de habitantes, a maior parte em situação precária, sendo que apenas 2 milhões já foram imunizados.

— Nós montamos um time de emergência para apoio na República Democrática do Congo numa campanha de vacinação de última hora, antes que a epidemia alcance Kinshasa — disse Ruairidh Villar, da ONG Save the Children, em entrevista ao “Guardian”. — Nosso temos é que a epidemia pode se tornar global se não conseguirmos detê-la antes que atinja a cidade.

A febre amarela é uma doença hemorrágica viral aguda transmitida por mosquitos infectados. O principal vetor é o Aedes aegypti, que também transmite dengue, zika e chicungunha. De acordo com a OMS, até 50% das pessoas gravemente afetadas sem tratamento morrem da doença. Há cerca de 130 mil casos de febre amarela notificados anualmente, causando 44 mil mortes no mundo a cada ano, sendo 90% no continente africano.

Os principais sintomas são febre alta, calafrios, cansaço, dor de cabeça, dor muscular, náuseas e vômitos por cerca de três dias. A forma mais grave da doença é rara e costuma aparecer após um período de bem-estar de até dois dias, quando podem ocorrer insuficiências hepática e renal, icterícia (olhos e pele amarelados), manifestações hemorrágicas e cansaço intenso.

Não existe um tratamento específico contra a doença, mas ela pode ser prevenida pela vacina. Entretanto, não é possível a implantação de um programa de erradicação, porque a febre amarela também ataca outros primatas, o que fornece ao vírus uma reserva natural.

Fonte: http://oglobo.globo.com/sociedade/saude/vacinacao-de-emergencia-tenta-conter-avanco-da-febre-amarela-na-africa-19932681

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