Terapeuta segue com projeto criado pela irmã após perdê-la para o câncer
Brilho de Luz foi criado pela jornalista Renata Carrer, que morreu em março.
Projeto auxilia pessoas com câncer por meio de novas terapias naturais.
Andrea Carrer transformou a perda da irmã em solidariedade (Foto: Mariane Rossi/G1)
Há cinco anos na luta contra o câncer, a jornalista Renata Carrer
experimentou as terapias naturais, que aliviaram o sofrimento do
tratamento e trouxeram mais energia a sua vida. Ao ver os benefícios,
ela montou o projeto Brilho de Luz para proporcionar atendimentos
terapêuticos de graça para os pacientes oncológicos de baixa renda.
Renata fundou o projeto, mas depois de cinco meses a doença voltou a
aparecer e ela morreu. Porém, Andrea Carrer transformou a perda da irmã
em solidariedade e não deixou que o ‘brilho’ de Renata se apagasse.
Hoje, o projeto ameniza a dor de centenas de pessoas com câncer, em
Santos, no litoral de São Paulo.
Jornalista e mãe de três filhos, Renata Carrer descobriu que estava com
câncer no útero em 2010. Depois, teve metástase no intestino e,
novamente, foi submetida à diversas operações. Renata fez quimioterapia,
radioterapia e até iodoterapia, tratamento clínico onde se administra
por via oral o iodo radioativo. A jornalista chegou a ficar internada na
UTI e ficou entre a vida e a morte, mas sobreviveu.
Renata foi vítima de câncer (Foto: Divulgação)
“Era um tipo de câncer muito raro e a expectativa de vida era de dois
anos”, conta Andrea Carrer, irmã da jornalista. Sabendo da situação de
Renata, Andrea veio visitar a irmã em dezembro de 2014. Na época, ela
morava em João Pessoa, com o marido e a filha.
“Eu peguei a minha irmã desmaiando no banheiro, sozinha, com dor. Minha
mãe estava cuidando da minha avó com Alzheimer no outro apartamento.
Não tinha quem cuidasse da minha irmã. Quando eu cheguei e vi aquela
cena. A Renata já estava em um processo considerado terminal”, conta.
Renata pediu à Andrea que não a deixasse naquele momento e ela atendeu
ao pedido da irmã. Pedagoga e terapeuta holística, Andrea atuava como
diretora de um Centro de Práticas Integrativas e Comunitárias em Saúde,
em João Pessoa, onde oferecia 26 tipos de terapias naturais pelo SUS.
Ela precisou largar o emprego e veio com o marido e a filha morar em
Santos, na casa dos pais dela.
Andre começou a aplicar terapias naturais na irmã, assim como fazia com
pacientes na Paraíba. As mais utilizadas eram reiki, terapia
ayurvédica, oriunda da medicina tradicional indiana, florais da Amazônia
e a geoterapia, que são feitas a partir de recursos da terra. No caso
de Renata, foi aplicada a argiloterapia.
“Ela começou a reagir muito e começou a se levantar. Mesmo tomando
morfina, o que tirava a dor dela eram as compressas de argila. Ela
tomava o comprimido e nada da dor diminuir. Ela me implorava para eu
colocar a argila”, conta a Andrea. Renata disse à Andrea que os florais
da Amazônia a tiraram da depressão.
Renata falando sobre as terapias naturais
(Foto: Arquivo Pessoal)
Quando Renata começou a ver o sofrimento sendo minimizado e passou a se
sentir melhor com a aplicação das terapias naturais, ela pensou o
quanto seria bom se todos os pacientes com câncer pudessem experimentar
esses tratamentos. Assim, Renata começou a idealizar um projeto para
oferecer atendimentos terapêuticos de graça para os pacientes
oncológicos de baixa renda.
“Ela lançou a ideia na internet. Como ela era bem conhecida, conseguiu
juntar muita gente que ficou mobilizada pelo pedido dela. Começaram a
vir os terapeutas voluntários que se juntaram a mim e meu marido. A
gente fazia no consultório particular e começamos a atender
gratuitamente”, diz.
Renata teve um sonho que deu o nome ao projeto. “Ela sonhou que estava
em uma floresta e, entre os raios de luz que entravam do sol, havia uma
senhora. Ela dizia que parecia como Nossa Senhora, mas não a via, só via
uma luz e um manto. E dizia para Renata que quando ela acordasse,
saberia o nome do projeto”, conta Andrea. Quando a jornalista acordou
escreveu uma música, que deu o nome de Brilho de Luz. A canção fala de
uma ‘Rainha da Floresta’ que lhe mostrou um caminho rumo à felicidade.
O projeto Brilho de Luz foi lançado em outubro de 2015 e passou a
funcionar dentro do Centro Integrado de Assistência a Pessoas com Câncer
(Cenin), que abraçou a ideia. Hoje, os pacientes têm acesso a 13 tipos
de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), que é o nome
dado pelo Ministério da Saúde às terapias naturais. A política nacional
foi inaugurada em 2006.
Renata e os pais, na inauguração do projeto (Foto: Arquivo Pessoal)
A ideia era complementar os tratamentos convencionais, diminuir os
efeitos colaterais e fazer com que os pacientes aprendessem a lidar com
sofrimento e medo causados pela doença. Além disso, o projeto também
busca atender às famílias dos doentes e contribuir para o debate sobre
os benefícios das terapias naturais na prevenção e no tratamento do
câncer. No início do projeto, Renata deu palestras para falar sobre a
sua experiência, o que mobilizou muitas pessoas.
Em novembro, os exames médicos de Renata apontavam que ela não tinha
nenhum tumor, depois de quase cinco anos de tratamentos. Logo depois,
Renata separou-se do marido. No começo deste ano, o tumor voltou perto
dos rins. “Ela disse que não ia operar de novo, que não tinha condições,
que ela não queria mais, não queria que os filhos tivessem que
presenciar todo o sofrimento, que o que ela veio fazer aqui na Terra já
tinha feito”, conta a irmã.
Atendimento coletivo do projeto Brilho de Luz
(Foto: Arquivo Pessoal)
Renata morreu em 18 de março deste ano. Já no quarto do hospital, ela
se despediu dos três filhos, ex-maridos, familiares e amigos. Andrea
conta que a irmã pediu para que ninguém chorasse e lembrasse dela com
alegria. E também fez um último pedido à irmã. “Ela dizia, no hospital,
logo no final, sem conseguir falar direito, para eu não deixar o Brilho
de Luz morrer. Eu prometi para ela que, aonde quer que eu estivesse, em
Santos ou qualquer outro lugar, eu levaria o Brilho de Luz comigo. Esse
foi o meu combinado com ela”, diz.
E assim Andrea o fez. O projeto completou um ano em outubro deste ano
com 287 atendimentos individuais e 25 coletivos. Andrea conta que a irmã
acreditava que o projeto era uma tarefa que ela deveria cumprir na
Terra e que iria em paz em saber que cumpriu o seu chamado.
“Ela começou as terapias naturais quando já estava em um estado
terminal, mesmo assim foi a paciente que mais apresentou melhora. O que
fica para mim agora é a saudade. Eu tive a oportunidade de ter um ano e
meio de convivência com a minha irmã, como eu não tinha fazia tempo.
Para mim, foi um presente”, finaliza Andrea.
Andrea é uma das coordenadoras o projeto criado pela irmã (Foto: Arquivo Pessoal)