segunda-feira, 31 de outubro de 2016

30/10/2016 07h30 - Atualizado em 31/10/2016 10h03

Terapeuta segue com projeto criado pela irmã após perdê-la para o câncer

Brilho de Luz foi criado pela jornalista Renata Carrer, que morreu em março.
Projeto auxilia pessoas com câncer por meio de novas terapias naturais.

Andrea Carrer transformou a perda da irmã em solidariedade (Foto: Mariane Rossi/G1) 

Andrea Carrer transformou a perda da irmã em solidariedade (Foto: Mariane Rossi/G1)

Há cinco anos na luta contra o câncer, a jornalista Renata Carrer experimentou as terapias naturais, que aliviaram o sofrimento do tratamento e trouxeram mais energia a sua vida. Ao ver os benefícios, ela montou o projeto Brilho de Luz para proporcionar atendimentos terapêuticos de graça para os pacientes oncológicos de baixa renda.  Renata fundou o projeto, mas depois de cinco meses a doença voltou a aparecer e ela morreu. Porém, Andrea Carrer transformou a perda da irmã em solidariedade e não deixou que o ‘brilho’ de Renata se apagasse. Hoje, o projeto  ameniza a dor de centenas de pessoas com câncer, em Santos, no litoral de São Paulo.

Jornalista e mãe de três filhos, Renata Carrer descobriu que estava com câncer no útero em 2010. Depois, teve metástase no intestino e, novamente, foi submetida à diversas operações. Renata fez quimioterapia, radioterapia e até iodoterapia, tratamento clínico onde se administra por via oral o iodo radioativo. A jornalista chegou a ficar internada na UTI e ficou entre a vida e a morte, mas sobreviveu.

Renata foi vítima de câncer (Foto: Divulgação) 
Renata foi vítima de câncer (Foto: Divulgação)

“Era um tipo de câncer muito raro e a expectativa de vida era de dois anos”, conta Andrea Carrer, irmã da jornalista. Sabendo da situação de Renata, Andrea veio visitar a irmã em dezembro de 2014. Na época, ela morava em João Pessoa, com o marido e a filha.

“Eu peguei a minha irmã desmaiando no banheiro, sozinha, com dor. Minha mãe estava cuidando da minha avó com Alzheimer no outro apartamento. Não tinha quem cuidasse da minha irmã. Quando eu cheguei e vi aquela cena. A Renata já estava em um processo considerado terminal”, conta.

Renata pediu à Andrea que não a deixasse naquele momento e ela atendeu ao pedido da irmã. Pedagoga e terapeuta holística, Andrea atuava como diretora de um Centro de Práticas Integrativas e Comunitárias em Saúde, em João Pessoa, onde oferecia 26 tipos de terapias naturais pelo SUS. Ela precisou largar o emprego e veio com o marido e a filha morar em Santos, na casa dos pais dela.

Andre começou a aplicar terapias naturais na irmã, assim como fazia com pacientes na Paraíba. As mais utilizadas eram reiki, terapia ayurvédica, oriunda da medicina tradicional indiana, florais da Amazônia e a geoterapia, que são feitas a partir de recursos da terra. No caso de Renata, foi aplicada a argiloterapia.

“Ela começou a reagir muito e começou a se levantar. Mesmo tomando morfina, o que tirava a dor dela eram as compressas de argila. Ela tomava o comprimido e nada da dor diminuir. Ela me implorava para eu colocar a argila”, conta a Andrea. Renata disse à Andrea que os florais da Amazônia a tiraram da depressão.
Renata falando sobre as terapias naturais (Foto: Arquivo Pessoal) 
Renata falando sobre as terapias naturais
(Foto: Arquivo Pessoal)

Quando Renata começou a ver o sofrimento sendo minimizado e passou a se sentir melhor com a aplicação das terapias naturais, ela pensou o quanto seria bom se todos os pacientes com câncer pudessem experimentar esses tratamentos. Assim, Renata começou a idealizar um projeto para oferecer atendimentos terapêuticos de graça para os pacientes oncológicos de baixa renda.

“Ela lançou a ideia na internet. Como ela era bem conhecida, conseguiu juntar muita gente que ficou mobilizada pelo pedido dela. Começaram a vir os terapeutas voluntários que se juntaram a mim e meu marido. A gente fazia no consultório particular e começamos a atender gratuitamente”, diz.

Renata teve um sonho que deu o nome ao projeto. “Ela sonhou que estava em uma floresta e, entre os raios de luz que entravam do sol, havia uma senhora. Ela dizia que parecia como Nossa Senhora, mas não a via, só via uma luz e um manto. E dizia para Renata que quando ela acordasse, saberia o nome do projeto”, conta Andrea.  Quando a jornalista acordou escreveu uma música, que deu o nome de Brilho de Luz. A canção fala de uma ‘Rainha da Floresta’ que lhe mostrou um caminho rumo à felicidade.

O projeto Brilho de Luz foi lançado em outubro de 2015 e passou a funcionar dentro do Centro Integrado de Assistência a Pessoas com Câncer (Cenin), que abraçou a ideia. Hoje, os pacientes têm acesso a 13 tipos de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), que é o nome dado pelo Ministério da Saúde às terapias naturais. A política nacional foi inaugurada em 2006.
Renata e os pais, na inauguração do projeto (Foto: Arquivo Pessoal) 
Renata e os pais, na inauguração do projeto (Foto: Arquivo Pessoal)

A ideia era complementar os tratamentos convencionais, diminuir os efeitos colaterais e fazer com que os pacientes aprendessem a lidar com sofrimento e medo causados pela doença. Além disso, o projeto também busca atender às famílias dos doentes e contribuir para o debate sobre os benefícios das terapias naturais na prevenção e no tratamento do câncer. No início do projeto, Renata deu palestras para falar sobre a sua experiência, o que mobilizou muitas pessoas.

Em novembro, os exames médicos de Renata apontavam que ela não tinha nenhum tumor, depois de quase cinco anos de tratamentos. Logo depois, Renata separou-se do marido. No começo deste ano, o tumor voltou perto dos rins. “Ela disse que não ia operar de novo, que não tinha condições, que ela não queria mais, não queria que os filhos tivessem que presenciar todo o sofrimento, que o que ela veio fazer aqui na Terra já tinha feito”, conta a irmã.
Atendimento coletivo do projeto Brilho de Luz (Foto: Arquivo Pessoal) 
Atendimento coletivo do projeto Brilho de Luz
(Foto: Arquivo Pessoal)

 Renata morreu em 18 de março deste ano. Já no quarto do hospital, ela se despediu dos três filhos, ex-maridos, familiares e amigos. Andrea conta que a irmã pediu para que ninguém chorasse e lembrasse dela com alegria. E também fez um último pedido à irmã. “Ela dizia, no hospital, logo no final, sem conseguir falar direito, para eu não deixar o Brilho de Luz morrer. Eu prometi para ela que, aonde quer que eu estivesse, em Santos ou qualquer outro lugar, eu levaria o Brilho de Luz comigo. Esse foi o meu combinado com ela”, diz.

E assim Andrea o fez. O projeto completou um ano em outubro deste ano com 287 atendimentos individuais e 25 coletivos. Andrea conta que a irmã acreditava que o projeto era uma tarefa que ela deveria cumprir na Terra e que iria em paz em saber que cumpriu o seu chamado.

“Ela começou as terapias naturais quando já estava em um estado terminal, mesmo assim foi a paciente que mais apresentou melhora. O que fica para mim agora é a saudade. Eu tive a oportunidade de ter um ano e meio de convivência com a minha irmã, como eu não tinha fazia tempo. Para mim, foi um presente”, finaliza Andrea.
Andrea comanda o projeto criado pela irmã (Foto: Arquivo Pessoal) 
Andrea é uma das coordenadoras o projeto criado pela irmã (Foto: Arquivo Pessoal)

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