Chikungunya pode levar a danos irreversíveis nos olhos, indica estudo
Pesquisadores fazem acompanhamento da saúde ocular de pessoas que tiveram chikungunya em Feira de Santana, na Bahia. De 2015 para 2016, casos de chikungunya aumentaram 606%.
A característica mais marcante da chikungunya são as fortes dores nas articulações,
que podem persistir por muito tempo depois da fase aguda da infecção.
Lesões vasculares, inchaço, perda de sensibilidade e até queda de cabelo
são sequelas que já foram identificadas na fase crônica da doença.
Agora, pesquisadores brasileiros estão monitorando as complicações
oculares que o vírus transmitido pelo Aedes aegypti pode desencadear.
Resultados preliminares de um estudo conduzido em Feira de Santana, na
Bahia, indicam que mais da metade dos pacientes com chikungunya
avaliados apresentam alterações oculares que levaram, em alguns casos, à
perda parcial ou total da visão de forma irreversível.
O oftalmologista Hermelino de Oliveira Neto, professor da Universidade
Estadual de Feira de Santana (UEFS) e coordenador do Hospital de olhos
de Feira de Santana (Clihon), está à frente do projeto, feito em
parceria entre a UEFS e pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
A literatura médica já apontava para a possibilidade de a chikungunya
afetar a saúde ocular. Um artigo de 2007 publicado na revista “Clinical
Sciences” descreveu casos de neurite óptica, um tipo de inflamação do
nervo óptico, em pacientes infectados pelo vírus na Índia. Mas o número
elevado de casos registrados no Nordeste do Brasil permitiu fortalecer
as evidências dessa associação.
Feira de Santana foi uma das primeiras cidades brasileiras a registrar
casos de chikungunya em 2014. Uma iniciativa da Fiocruz e da UEFS passou
a acompanhar pacientes com chikungunya na cidade para verificar os
efeitos de longo prazo da doença. A equipe de Hermelino passou a fazer
exames oftalmológicos nos pacientes que já eram acompanhados pelo
projeto. “A gente criou um consultório itinerante e montou ao lado da
sala de atendimento desse grupo”, conta o oftalmologista.
O atendimento oftalmológico se dá uma vez por mês e começou em
novembro. Até o momento, foram avaliados 87 olhos de 44 pacientes com
exames positivos para chikungunya.
"É importante termos o conhecimento de que essa doença cega. Tenho uma paciente que está cega por uma doença que poderia ser evitada", Hermelino de Oliveira Neto, oftalmologista
Do total de pacientes avaliados, 75% relatou queixas oculares, desde as
mais simples até as mais intensas, e 54% apresentou lesão nos olhos. Em
5% dos pacientes, foi detectada uma lesão importante na retina e no
nervo ótico que levou a uma baixa de visão severa e irreversível.
“É importante termos o conhecimento de que essa doença cega. Tenho uma
paciente que está cega por uma doença que poderia ser evitada”, diz
Hermelino. Para ele, os resultados reforçam a importância de se prevenir
a proliferação da doença e de estudar novas formas de intervenção que
possam diminuir os riscos de complicação na fase aguda da doença.
Até o momento, ainda não está claro como o vírus atua para afetar a
visão. Hermelino explica que existe uma suspeita de que o vírus agrida
os olhos diretamente. Outra suspeita é que se trata de um fenômeno
autoimune: que os anticorpos produzidos para combater o vírus levariam a
um processo inflamatório intenso que afetaria os olhos.
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