Ministério Público do DF identifica surto de doença infecciosa na Papuda
Transmitida por bactérias, doença infectou 692 detentos, diz GDF. Condições insalubres e carência de atendimento médico são apontados por especialistas como principais causas.
Por Luiza Garonce, G1 DF
Funcionário cuida de gramado em frente a Papuda, em Brasília (Foto: Gláucio Dettmar/CNJ/Divulgação)
O Complexo Penitenciário da Papuda, no Distrito Federal, tem 692
detentos contaminados por dois tipos de doença infecciosa que provocam
feridas e fungos na pele. Os dados são da Secretaria de Segurança
Pública, que disse ter iniciado o tratamento dos infectados.
Para apurar a situação, o Ministério Público fez vistoria na Papuda em
27 de junho. O órgão disse que deve fazer novas visitas para monitorar a
situação e que vai tomar "todas as medidas necessárias até que o
problema de saúde seja resolvido."
O caso também é acompanhado pela Vara de Execuções Penais (VEP), que informou ter feito inspeções no local, e constatou que os "atendimentos emergenciais já haviam sido prestados".
O G1 conversou
com uma especialista em saúde e uma advogada criminalista sobre o surto
das doenças nos presídios e as dificuldades de controle de saúde.
Detentos na Papuda em 2013 (Foto: Ministério Público/Divulgação)
Apesar de parecer alarmante, o número representa 10% do total de presos
em duas alas da Papuda – o Centro de Detenção Provisória, onde há 3.623
presos e 172 infectados, e a Penitenciária I, onde há 3.800 detentos, e
520 com alguma das doenças.
De acordo com a advogada criminalista Daniela Tamanini, que tem
clientes no presídio, doenças transmitidas por fungos e bactérias, como
micoses, são comuns nos presídios devido às condições precárias de
infraestrutura e higiene.
"Todos eles têm algum tipo de micose, brotoejas e coceiras, às vezes até pela ingestão de alimentos estragados. E quando tem um doente, ele está em contato com outro mil."
Além da superlotação das celas, da falta de circulação de ar e da
limpeza precária, o atendimento médico não é adequado, segundo a
advogada. "Mesmo eles tendo uma ala médica lá dentro, com dois a três
médicos, conseguir atendimento é difícil. Ainda mais porque essas
micoses são muito comuns."
Camas usadas pelos detentos no presídio da Papuda, no DF (Foto: Ministério Público/Divulgação)
As doenças identificadas pela governo são a escabiose
e o impetigo, infecções de pele provocadas por ácaros e bactérias.
Ambas têm maior chance de proliferação em ambientes fechados com
aglomeração de pessoas, como escolas, creches, quartéis e presídios.
O infectologista e comentarista da TV Globo Luiz Antônio Silva explicou
que a escabiose é popularmente conhecida como "sarna" e provoca
pequenas bolas avermelhadas na pele que coçam bastante.
Foto
do portal do Sindpen mostra doença de pele provocada por bactérias
atingiu, ao menos, 600 detentos da Papuda, em Brasília (Foto: Sindicato
dos Agentes Penitenciários/Reprodução)
Ao coçar – especialmente à noite, quando o sintoma se intensifica – é
comum que sejam formadas feridas e o contato com bactérias presentes na
unha em ambiente externo gera a infecção, neste caso chamado impetigo.
"Nós chamamos de escabiose impetignada, porque uma provoca a outra. É
uma doença secundária, que causa infecção na pele pela coceira das
feridas. Pode dar até fungo."
Os sintomas podem se manifestar em todo o corpo, inclusive nas regiões
íntimas. Imagens publicadas pelo Sindicato dos Agentes Penitenciários
(Sindpen) mostram as reações em alguns detentos.
Foto
do portal do Sindpen mostrando imagens de detentos da Papuda com
sintomas de doença infecciosa (Foto: Sindicato dos Agentes
Penitenciários/Reprodução)
A recomendação médica para evitar complicações é que o tratamento seja
iniciado em até 48 horas depois do aparecimento dos primeiros sintomas.
"Geralmente, entra com uso de antibiótico oral pra tratar as feridas e
pomadas pra evitar a coceira. Mas é preciso tratar todo mundo de uma
vez", disse o médico.
Vaso sanitário de detentos do Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília (Foto: Ministério Público/Divulgação)
Cuidados
A Secretaria de Segurança Pública informou ao G1 que
as infecções "foram controladas por meio de medicação assim que foram
identificadas, por volta do dia 20 de junho". Segundo a pasta, quando o
Ministério Público esteve no local, os tratamentos já haviam começado.
Médicos e enfermeiros das unidades prisionais têm feito mutirões de
triagem dos internos para verificar se há novos casos das doenças,
segundo a pasta. Os profissionais também estão orientando os presos
sobre higiene pessoal, especialmente quanto às mãos, e as celas estão
passando por limpeza.
Colchão e outros objetos próximos a uma cela de transição na Papuda, em Brasília (Foto: Gláucio Dettmar/CNJ/Divulgação)
Descontente, o presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários,
Leandro Allan, afirmou que a situação é alarmante e pode piorar, já que a
transmissão da doença ocorre pelo contato e os presos doentes estariam
convivendo com detentos sadios.
"Nossa preocupação é que se espalhe, porque os presos foram distribuídos em alguns blocos por determinação de não sei quem."
O risco de contágio também é grande para quem trabalha com os presos,
como os agentes e funcionários da limpeza. "Além disso, somente nessa
unidade, passam 3 mil visitantes toda semana", afirmou. Pelo risco de
transmissão, ele sugere que as visitas fossem suspensas até que a
situação estivesse controlada.
No entanto, a Secretaria de Segurança diz que não há motivos para
suspender as visitas, porque, mesmo que as doenças tenham atingido quase
10% do total de presos em duas alas da Papuda, "não significa que os
estabelecimentos prisionais estão passando por um quadro de epidemia".
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