quarta-feira, 4 de novembro de 2015

CPI aprova obrigar hospitais a notificarem abortos à polícia

Relatório da Comissão do Aborto, da Alerj, é alvo de protesto de movimentos feministas

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Representantes de movimentos feministas colaram cartazes na fachada da Alerj contra o relatório da CPI do Aborto - Clarissa Pains


RIO — A CPI do Aborto, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio (Alerj), aprovou seu relatório final nesta quarta-feira, dia 28, sugerindo maior rigor na punição relativa à interrupção da gravidez. O documento inclui medidas polêmicas como a obrigatoriedade de os hospitais notificarem a polícia todos os casos de aborto que eles atenderem, até mesmo os permitidos por lei ou os espontâneos. Para os movimentos de defesa dos direitos das mulheres, isso, caso entre em vigor, ajudará a aumentar a vitimização e o número de abortos inseguros. Dos sete deputados que participam da CPI, apenas Paulo Ramos (PSOL-RJ) votou contra a aprovação do documento. A pauta, agora, segue para votação no plenário da Casa, ainda sem data marcada.
— Este relatório é um crime contra as mulheres, porque as deixa mais desprotegidas. Depois de uma violência sexual que resultou em gravidez, muitas mulheres dificilmente vão se dispor a procurar um hospital público que passe os seus dados para a polícia, para que ela seja investigada. Isso seria uma nova violação — defende o deputado Paulo Ramos.
Cartazes contra a decisão da CPI foram colados na fachada da Alerj por representantes de movimentos sociais como o Meu Rio, o Fórum Estadual de Mulheres e a Marcha Mundial de Mulheres. Eles ressaltam que as pessoas que já passaram por uma situação de aborto não foram ouvidas pela comissão, que se deteve a ouvir órgãos de vigilância sanitária, representantes de farmacêuticas e autoridades policiais.
— Nem a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da própria Alerj foi ouvida. Desde o início, essa CPI trata o problema dos abortos inseguros como uma pauta de criminalidade, e não de saúde pública. Não adianta tornar mais constrangedor o acesso da mulher ao aborto legal, nem fazer uma caça aos medicamentos abortivos. É preciso, ao contrário, dar mais condições para que, quando ela julgue necessário, realize um aborto dentro dos padrões de segurança e sem constrangimentos — diz Monica Miranda, membro da União Brasileira de Mulheres (UBM), um dos grupos sociais que acompanharam a votação.
Desde 2012, as únicas três situações em que o aborto é permitido são em caso de estupro, risco de vida para a mulher ou feto com anencefalia. De acordo com movimentos feministas, até mesmo nesses casos as grávidas encontram barreiras como a escassez de centros de saúde que de fato realizam o procedimento.
Paola Mendes, da Marcha Mundial das Mulheres, ajudou a organizar o protesto "Mulheres contra Cunha", que ocorre nesta quarta-feira na Cinelândia - Clarissa Pains
Para o relator da CPI do Aborto, deputado Jânio Mendes (PDT-RJ), a comissão está sendo "mal interpretada".
— Talvez essa comissão tenha sido mal interpretada. Aqui não está em questão a legalidade do aborto nos casos que a lei prevê. O que queremos é impedir que interesses comerciais, como os relacionados à venda de medicamentos abortivos, incentivem a prática do aborto — afirma ele.
Também nesta quarta-feira, na Cinelândia, ocorre o protesto "Mulheres contra Cunha", organizado pela Marcha Mundial das Mulheres por meio das redes sociais. Além de repudiar o relatório da CPI do Aborto, no Rio, a manifestação tem como objetivo pedir a derrubada do Projeto de Lei 5069, proposto por Eduardo Cunha (PMDB/RJ). Se aprovado, ele obriga que a mulher estuprada faça boletim de ocorrência na delegacia — o que não é exigido desde 2005 — e criminaliza qualquer pessoa que ajude uma mulher a abortar ilegalmente.

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