Elca Rubinstein ensina a viver de bem com a morte
Enquanto
muita gente trata a velhice como um tabu a ser evitado, Elca Rubinstein
não perde a oportunidade de trazer o assunto à tona. Ela é Ph.D. em
economia, formada pela USP, onde foi professora até ir para o Banco
Mundial, em Washington, onde trabalhou de 1986 a 2003. Quando se
aposentou, em vez de parar resolveu expandir seus horizontes: fez cursos
sobre gerontologia, estuda para ser rabina e se prepara para prestar
serviços como end-of-life doula
– assim como há doulas para acompanhar a gravidez, há uma formação
específica para acompanhar o paciente, e sua família, em seus momentos
derradeiros.
“Nessa
nova fase da vida, é fundamental ter consciência da necessidade de
encarar a finitude. Isso também significa aceitação, aprender a se
livrar das mágoas, dos ressentimentos, das questões mal resolvidas. Ao
assumir minha velhice, ganhei um futuro, um olhar para o mundo que não
tinha antes”, afirma, esbanjando vitalidade.
Aos
71 anos, Elca dá os primeiros passos como cineasta. É responsável pelo
argumento e captação de recursos do média-metragem “Branco e prata”,
dirigido por Humberto Bassanelli. No filme, que está em fase de
montagem, mulheres contam por que deixaram de tingir os cabelos e
assumiram os fios brancos. Algumas até enfrentaram críticas, como se
tivessem aberto mão de sua feminilidade, mas todas se sentem mais
charmosas e seguras atualmente – inclusive a própria Elca, que participa
com seu depoimento. Ainda não há data de estreia, mas aqui você pode assistir a um teaser da produção.
Ela fez questão de preparar seu testamento vital,
documento que pode ser feito por qualquer pessoa em pleno gozo de suas
faculdades mentais, com o objetivo de dispor sobre os cuidados e
tratamentos que deseja ou não ser submetida quando estiver
impossibilitada de manifestar sua vontade:
“E
faço como os americanos: guardo o testamento vital no congelador, num
daqueles saquinhos de congelar alimentos. Nos EUA, esse é um
procedimento padrão e todos sabem onde procurar o documento numa
situação de emergência. Eu me fiz cinco perguntas, sobre as quais
refleti muito: quem vai responder por mim, ou seja, quem será meu
representante se eu não puder falar; que tratamentos quero e quais não
quero; como quero me sentir; como quero que me cuidem; e quais são os
meus legados. Neste caso, não se trata dos bens de uma herança, mas dos
ensinamentos que gostaria de dividir com as pessoas mais próximas. O
processo envolveu muitas conversas, a começar comigo mesma. Depois com
os médicos que me acompanham e, por fim, com meus três filhos, que têm
entre 40 e 50 anos. No dia dessa reunião, minha filha, a primogênita, me
abraçou e disse que podia contar com ela para tudo. A primeira reação
do do meio foi dizer que assinava onde fosse preciso, mas que não queria
saber de nada. O caçula se saiu com uma frase do tipo: ‘Mãe, você não
vai morrer nunca!’. Em seguida, foi a vez do advogado, e agora com todo
mundo com quem eu puder compartilhar”, explica.
Falando
em compartilhar, o Death Café Sampa, criado em 2014, tem a assinatura
de Elca. É, como ela diz, “um espaço onde é fácil falar de coisas
difíceis”. O Death Café surgiu a partir das ideias do sociólogo suíço
Bernard Crettaz, que cunhou a expressão “sigilo tirânico” para descrever
o medo e a rejeição que a maioria tem de falar sobre a morte. O
objetivo das reuniões é aumentar a consciência sobre a finitude, com
vista a ajudar as pessoas a aproveitarem melhor suas vidas. A próxima
será no dia 21 de maio, no Cemitério Redentor, em São Paulo. O grupo tem
uma página no Facebook e um blog para quem quiser acompanhá-lo.
Foto: Mariza Tavares
Nenhum comentário :
Postar um comentário