INTRODUÇÃO:
A escápula é um osso plano e faz a conexão entre a
extremidade superior e o esqueleto axial, lesões deste complexo
osteo-ligamentar podem causar alterações biomecânicas da cintura
escapular. A fratura da escápula geralmente ocorre por traumas de alta
energia, mais comumente por trauma direto do que indireto, sendo os
acidentes de trânsito a principal causa.
EPIDEMIOLOGIA:
A maioria das fraturas da escápula (>90%) são minimamente
desviadas, porém a associação com outras fraturas e lesões de partes
moles é de 80% a 95%, principalmente no torso ipsolateral. Muitas vezes
fraturas de escápula são sinais de alerta de lesões mais graves.
Costelas fraturadas ipsolaterais são encontradas em até 54% dos casos.
Outras lesões variam desde rupturas musculares com formação de grandes
hematomas, pneumotórax, hemotórax, lesão do plexo braquial dentre
outras.
Na revisão da literatura, estas fraturas representam menos que 1 %
de todas as fraturas e somente 3 % a 5% de todas as lesões ósseas do
ombro. Esta baixa incidência se deve á sua posição posterior à caixa
torácica, ser envolvida por músculos e possuir grande mobilidade, que
dissipa forças traumáticas.
Considerando as regiões envolvidas, 50% das fraturas ocorrem
corpo e espinha, 35% na glenoide (colo 25%, cavidade 10%), no acrômio 8%
e 7% no processo coracoide.
DIAGNÓSTICO:
Os sinais e sintomas iniciais das fraturas da escápula muitas
vezes são pouco característicos, pode se notar edema local e crepitação
anormal, em geral o membro superior está aduzido, com dor e diminuição
da mobilidade do ombro como um todo, e o movimento de abdução doloroso.
EXAMES DE IMAGEM
O diagnóstico específico destas fraturas é radiográfico. A
“série trauma”- AP verdadeira, perfil de escápula e axilar, é o mais
usado, podendo ser complementado pela incidência de frente comparativo
com peso, sugerido por Rockwood (1), para avaliar lesão do complexo
suspensório superior do ombro e incidência de Striker, que poderá ajudar
na suspeita de fratura de processo coracoide.Tomografia computadorizada
(TC) pode ser útil para melhor caracterização das fraturas envolvendo a
superfície articular da glenoide, havendo o recurso da reconstrução
tridimensional.
CLASSIFICAÇÃO:
Várias classificações das fraturas da escápula foram propostas,
com base na sua localização anatômica e frequência. A classificação mais
utilizada é a anatômica, que divide em: fraturas da cavidade
glenoideia, fraturas do colo da glenoide, fraturas do corpo da escápula,
fraturas do acrômio e espinha da escápula, fraturas isoladas do
coracoide e lesões do complexo suspensório superior (CSSO). Goss (1993)
chamou de complexo suspensório superior do ombro (CSSO), como um anel
composto por tecidos moles e ósseo envolvendo glenoide, coracóide,
acrômio, clavícula distal e ligamentos. Sendo que uma ruptura dupla
deste anel criará uma situação potencialmente instável.
Fraturas da cavidade glenoidea
Correspondem a 10% das fraturas das fraturas da glenoide. São
subdivididas em fraturas marginais e fraturas da fossa da glenoide.
Fraturas marginais da glenoide são consideradas desviadas se a distancia
entre os fragmentos for maior ou igual a 1 cm, ou se envolver mais de
20% da borda anterior da glenoide ou mais de 30% da borda posterior da
glenoide. As fraturas da fossa da glenóide são consideradas desviadas se
o degrau entre os fragmentos for maior ou igual a cinco milímetros.
Gross-Ideberg classifica as fraturas da cavidade glenoidea: Tipo I
– fraturas da borda da glenoide; tipo Ia – anterior; e tipo Ib –
posterior; tipo II – fratura transversa através da fossa glenoide com
fragmento triangular inferior deslocado; tipo III - fratura oblíqua
através da glenoide, dirigida para borda superior da escápula e
frequentemente associada à fratura ou luxação acromioclavicular; tipo IV
- fratura horizontal da glenoide, dirigida para a borda medial da
escápula; tipo Va - combinação dos tipos II e IV; tipo Vb – combinação dos tipos III e IV e tipo Vc – combinação dos tipos II, III, IV; e tipo VI
Fraturas do colo da glenoide
As fraturas do colo da glenoide são classificadas em tipo I – sem
desvio e tipo II desviadas. Consideramos desvio se a distancia entre os
fragmentos for maior ou igual a 1cm e o desvio angular maior ou igual a
40 graus. Quando há associação da fratura do colo com lesão do
mecanismo suspensório do ombro (CSSO), chamamos de ombro flutuante, que é
uma situação potencialmente instável.
Classificação do Ombro Flutuante: A Tipo IA; B, Tipo IB; C, Tipo II; D,Tipo IIIA: E, Tipo IIIB. Tipo I – Lesão óssea pura, subdivide-se em Ia – colo + base do coracoide; e IB – colo + clavícula e espinha de escápula ou acrômio. Tipo II – lesão ligamentar pura: colo + ligamentos coracoacromial
e coracoclaviculares. Tipo III – lesão óssea e ligamentar; Tipo IIIa –
colo + diáfise da clavícula + ligamentos coracoacromiais e
coracoclaviculares e IIIb – colo + acrômio ou espinha da escapula +
ligamentos coracoclaviculares e coracoacromiais.
Paciente masculino, 26 anos de idade, leucodérmico, publicitário, destro, vítima de acidente motociclístico com trauma direto no ombro esquerdo. Atendido inicialmente em outro hospital com diagnóstico de fratura da escápula esquerda, encaminhado para " continuidade do tratamento conservador da fratura" .
Ao exame, apresentou dor forte no ombro esquerdo, importante limitação dos movimentos da articulação glenoumeral, principalmente da rotação externa, escoriação na região posterior do ombro, edema e deformidade sugerindo luxação posterior da articulação glenoumeral esquerda. Pulso preservado e sem déficit neurológico da extremidade afetada. A série trauma foi feita; a incidência em axilar foi somente realizada posteriormente com o paciente já anestesiado. A radiografia em AP verdadeiro confirmou a fratura do colo da glenóide sem envolvimento articular e uma fratura do processo coracoide, caracterizando uma variação de ombro flutuante. O perfil da escápula sugeriu luxação glenoumeral posterior.
A tomografia computadorizada (TC) confirmou a fratura extra-articular do colo da glenoide, que se encontrava totalmente anteriorizada, fratura da base do processo coracoide, associadas à luxação posterior da cabeça umeral (figuras 2a, 2b e 2c).
No centro cirúrgico, sob bloqueio interescaleno e sedação, não foi possível obter-se a redução da luxação, mesmo após várias tentativas. A visualização fluoroscópica revelou que a tração era ineficiente, pois estava havendo um movimento anormal no foco da fratura, impossibilitando, assim, a redução incruenta.
Programaram-se, então, a redução cruenta da luxação e o tratamento cirúrgico da fratura do colo da glenoide.
O paciente foi posicionado em decúbito lateral direito, sob anestesia geral e bloqueio interescaleno, com o membro superior esquerdo (MSE) livre para movimentação durante o ato cirúrgico.
Feita incisão longitudinal de 10cm na região posterior do ombro esquerdo, tipo Judet, na junção dos dois terços mediais com o terço lateral da espinha da escápula. O deltoide posterior foi afastado superiormente, facilitado pela abdução do braço. Identificação do espaço entre o músculo infra-espinhal e o redondo menor com evidenciação do foco da fratura, que se iniciava na incisura escapular e descia pelo colo, até terminar na borda medial da escápula. O nervo supra-escapular estava íntegro, porém pinçado no foco da fratura.
A luxação foi reduzida sem muita dificuldade e a cápsula posterior foi aberta para visualização da articulação.
A fratura foi reduzida e fixada com uma placa de reconstrução pélvica com somente três parafusos corticais em função da posição da fratura, após prévio afastamento do nervo supra-escapular (figuras 3a, 3b, 3c).
Qualquer bloqueio mecânico foi afastado após verificação de ampla movimentação articular.
O controle radiológico confirmou a redução da luxação glenoumeral, uma osteossíntese satisfatória da fratura do colo da glenoide e redução da fratura da base do processo coracoide (que não necessitou fixação), reconstruindo, assim, a anatomia do ombro.
O paciente foi imobilizado em tipoia tipo velpeau, pois a redução da articulação mostrava-se estável, mesmo na posição de rotação interna máxima. Durante a evolução, a consolidação se deu normalmente, resultando em um ombro funcionalmente normal.
Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-36162007001000005&script=sci_arttext
Fraturas do acrômio e espinha da escápula
A classificação proposta por Kuhn e colaboradores. Tipo I – com mínimo deslocamento; tipo II - deslocadas.
Fonte: http://www.clinicagenus.com.br/noticia/item/13
Fonte: http://www.tudosobreombro.com/lesoes-do-esporte/osteolise-acromio-clavicular-2/
Fraturas de processo coracoide
São classificadas segundo a região anatômica: Tipo I – Fraturas
da extremidade; tipo II – Fraturas entre os ligamentos coracoclavicular e
coracoacromial; e tipo III – fraturas da base do coracoide, a mais
comum.
TRATAMENTO
A maioria das fraturas da escápula são tratadas incruentamente.
Fraturas do corpo da escápula e espinha assim como fraturas sem desvio
da glenoide, acromio e coracoide são tratadas com imobilização com
tipoia por 4 a 6 semanas, incentivando pendulares após a primeira
semana, aumentando gradativamente a amplitude de movimento, caso se
sinta confortável. Analgésicos na fase aguda da dor e crioterapia,
principalmente nas primeiras 48 horas é útil. Imobilização absoluta
poderá ser necessária de 48 horas até duas semanas dependendo da
gravidade. Importante o controle radiográfico após duas semanas. A
fisioterapia é de grande auxílio, reservamos seu início após a segunda
semana, ocasião que se orienta movimentos passivos e autopassivos, pois o
paciente já não está na fase aguda da dor. Movimentos ativos após a
quarta semana.
Nas fraturas do colo da escápula, o tratamento é incruento na maioria das vezes. Distancia
entre os fragmentos maior ou igual a 1 cm ou 40 graus ou mais de
angulação caracterizam desvio significativo, é recomendável tratamento
cirúrgico, pois grandes desvios alteram a relação do espaço subacromial,
causando impacto ou mesmo perda de força. A lesão torna-se instável se
houver associação com lesão do complexo suspensório necessitando de
tratamento cirúrgico na maioria das vezes. Redução aberta e fixação
interna (RAFI), do colo da glenoide é uma boa opção. Casos onde a
fratura do colo de glenoide se associa com fratura diafisária da
clavícula, RAFI da clavícula é a mais indicada pela menor morbidade em
relação á cirurgia da escápula.
As fraturas intra-articulares da glenoide recebem mais indicações
cirúrgicas. São divididas em marginais e da fossa da glenoide. A
Tomografia computadorizada (TC) é de grande valia. As chances de evoluir
com luxação recidivante gleno-umeral, são consideráveis, principalmente
em jovens, aumentado as indicações cirúrgicas. As fraturas da fossa da
glenoide são cirúrgicas caso desvio seja maior do que 5mm, são tratadas
pelos mesmos princípios das fraturas articulares, necessitando de
redução adequada da superfície articular, evitando degeneração
articular.
Fraturas do acrômio tipo II, deslocadas para o
espaço subacromial necessitam de cirurgia. Recomenda-se fixação com
banda de tensão ou placas e parafusos.
Para fratura do processo coracoide isolada a maioria dos autores
não recomendam nenhum tipo de tratamento cirúrgico. Em caso de fraturas
deslocadas associadas com separação acromioclavicular, é recomendado a
fixação acromioclavicular.
Referencias Bibliográficas
Charles A. Rockwood, Jr., MD, Frederick A. Matsen, III, MD, Michael A. Wirth, MD and Steven B. Lippitt, MD. The Shoulder, 4th edition; Oct 2008.Pgs 333-380
jacob M. Lantry , Craig S. Roberts , Peter V. Giannoudis . Operative treatment of scapular fractures. A systematic review.
Michael J. DeFranco, MD, and Brendan M. Patterson, MD; Journal of
the American Academy of Orthopaedic Surgeons; Volume 14, Number 8,
August 2006.
Fonte: http://www.clinicagenus.com.br/noticia/item/13
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