Zika faz repelente esgotar e farmácias adotam lista de espera em Campinas
Epidemiologista esclarece mitos e verdades sobre proteção contra mosquito.
Dez casos de microcefalia estão sendo investigados sobre relação com zika.
Farmácias de Campinas (SP) estão fazendo listas de espera para o repelente de alta duração que combate o mosquito Aedes aegypti. O produto Exposis, fabricado com icaridina - princípio ativo que garante proteção de 10 horas, segundo o fabricante - tem sido o mais procurado por gestantes e está em falta nas prateleiras.
O laboratório Osler Brasil admite que a demanda foi muito maior do que o esperado e informa que a expectativa é normalizar a distribuição em até 15 dias. Em resposta ao G1 o fabricante confirmou o aumento na demanda nos estados do Nordeste e informou que, "mesmo com um aumento proporcionalmente menor da região Sudeste e Sul, em números absolutos, houve um aumento generalizado em todos os estados do país".
"O Exposis está disponível nas 20 maiores redes de farmácias e nas 10 maiores distribuidoras de produtos farmacêuticos". O abastecimento foi priorizado, mas "mesmo assim algumas farmácias ficam sem produtos momentaneamente", diz a nota.
Em uma das maiores redes de farmácias da cidade, a atendente desanima. "A gente compra um lote fechado (...) A gente era pra ter mais. Se pra gente acabou, é difícil encontrar". Nas demais farmácias só se houve "Faz uma semana que não tem", "A lista é grande, duas ou três pessoas vão levar quatro", "Vendi o último anteontem e não consigo comprar para a revenda (...) Peço todos os dias".
A Vigilância Epidemiológica de Campinas investiga a relação entre o nascimento de 10 bebês com microcefalia na cidade e a infecção das mães por zika vírus durante a gestação. Os exames estão em andamento e, até o momento, não houve confirmação desta relação nestes casos pelo Instituto Adolfo Lutz. O governo federal declarou situação de emergência há um mês.
O zika vírus é transmitido pelo Aedes (o mesmo da dengue e chikungunya) e também pode causar outras doenças neurológicas e lesões na medula espinhal, sem distinção de gênero e idade, segundo o médico epidemiologista e membro da vigilância de Campinas, André Ribas Freitas. O especialista alerta sobre alternativas ao Exposis e sobre o uso de produtos naturais. [Leia ao longo da reportagem]
Nome na lista e falta de previsão
O G1 e a EPTV, afiliada da TV Globo, buscaram o repelente Exposis em fármacias de diversas regiões da cidade. O resultado foi o mesmo em todas: Produto em falta e sem previsão para um estoque que tranquilize os consumidores em busca da proteção anunciada de 10 horas contra o Aedes.
Na região do Parque Prado e do Castelo, por exemplo, a prática de adotar lista de espera se tornou comum há alguns dias. Cada consumidor relata a quantidade de frascos do repelente que quer comprar, sem restrição de número de unidades. Mas, também, sem prazo para receber uma ligação telefônica avisando que o produto chegou.
Em uma das drogarias visitadas, o atendente conta que até já tentou fazer lista, mas não deu certo. "A gente começou no início a fazer uma listinha, mas paramos porque não vai dar certo não. Cinco a seis folhas (...) Não vai ter como atender", diz.
Na região central da cidade, há farmácia que não recebe o produto há três meses, outras estão sem o repelente há uma semana e garantem que a procura é grande. Por isso, algumas também afastam a possibilidade do cliente fazer encomendas.
Na região do Campo Grande há farmácias que nem costumam receber o Exposis e relatam que a procura por outras marcas é grande. As que chegaram a receber o produto relatam a venda imediata.
Variação no preço
O laboratório informou ao G1 que o preço sugerido é de R$ 55, mas o Exposis pode ter valores de R$ 45 a R$ 72, conforme constatado na busca do G1. Independentemente do custo, dez, 15 ou mais nomes na lista é o que o cliente em início de peregrinação tem enfrentado pela frente.
O que diz o fabricante
De acordo com a assessoria de imprensa do Laboratório Osler Brasil, responsável pela produção e distribuição do repelente Exposis, a confirmação dos casos de microcefalia e a relação com o zika vírus fez com que a demanda do produto crescesse de uma maneira nunca vista.
O tempo de produção não está sendo suficiente para a demanda que surgiu em pouco tempo, segundo o laboratório. No entanto, a Osler informou que a produção é feita 24 horas por dia e que a substância, que vem da França, está chegando de avião. A expectativa é normalizar a entrega nas farmácias em até 15 dias.
Alternativas ao Exposis
O médico epidemiologista da Secretaria Municipal de Saúde e membro da Vigilância Epidemiológica, que investiga os casos de microcefalia, André Ribas Freitas, alerta para mitos e verdades sobre a proteção. Segundo ele, há alternativas para o Exposis, que não incluem produtos naturais.
"O Exposis é mais recente, mas nem por isso é melhor. Ele tem maior durabilidade. É uma particularidae da concentração da icaridina, que só esse produto tem", afirma.
Além da substância icaridina, presente no Exposis, outras duas protegem contra o Aedes aegypti: DEET e IR3535, também indicados para gestantes.
Freitas afirma que os produtos com DEET demandam uma aplicação mais frequente do repelente, a cada duas horas em média. Segundo ele, o risco de intoxicação é pequeno. E recomenda que as pessoas sigam a forma de aplicação informada pelo laboratório no rótulo.
Alerta sobre produtos naturais
O epidemiologista alerta que produtos naturais à base de óleo de citronela, cravo no limão e óleo com vinagre não têm eficiência comprovada contra o mosquito.
"Na verdade, qualquer óleo que passar na pele vai dificultar a picada porque altera a superfície da pele, que fica oleosa. Ele diminui o número de picadas, mas não afasta o mosquito", explica Freitas.
Sintomas do zika vírus
Os sintomas do zika vírus são: Manchas vermelhas grandes e de alto relevo pela pele, que podem estar acompanhadas de febre, dor articular, coceira e olhos avermelhados. A pessoa que perceber alguns dos sintomas, principalmente as manchas, deve procurar o serviço de saúde para uma avaliação.
No entanto, segundo Freitas, no caso de confirmação da doença não há muito o que fazer. Por isso, a principal forma de evitar os problemas de saúde que ela pode vir a causar é se proteger com o uso de repelentes.
Lesões neurológicas e medulares
O que se sabe sobre o zika vírus, a partir dos casos registrados no Brasil e também na Polinésia Francesa anos atrás, é que a doença pode causar lesões neurológicas, como encefalite (inflamação no cérebro), que causa confusão mental e alteração do nível de consciência. Também pode causar lesões medulares, como a mielite (inflamação na medula espinhal), que provoca paralisia nos membros.
"O problema do zika é que muito pouco se sabe sobre esse víirus. Até dois anos atrás não havia mais que 200 casos no mundo. Era considerado um vírus silvestre, era um vírus de macaco. A única epidemia grande que ele deu foi num conjunto da Polinésia Francesa, um lugar que a medicina não é tão desenvolvida. Foi em outubro de 2013 e terminou em fevererio de 2014", explica o epidemiologista.
Segundo ele, também já se sabe que não há casos hemorrágicos, diferentemente da dengue.
Microcefalia e risco para gestantes
As mulheres que tiveram bebês recentemente com microcefalia em Campinas engravidaram nos primeiros meses do ano, quando já havia epidemia de dengue na cidade e, portanto, maior circulação do Aedes aegypti. No entanto, segundo Freitas, o uso do repelente, apesar de difundido pelos órgãos de saúde, não era feito de forma tão cuidadosa.
"Nada se compara à microcefalia. As pessoas não se protegiam da mesma forma como estão se protegendo agora", afirma Freitas.
Durante a epidemia de dengue na cidade, não houve casos confirmados do zika vírus. Mas, em Sumaré (SP), cidade vizinha, houve um caso em maio, em um homem. Segundo o médico, não houve uma grande pesquisa sobre este caso para saber se ele pode ter chegado em Campinas.
"Não temos como confirmar que não houve caso em Campinas de zika", completa.
Freitas alerta que a circulação do mosquito começa a aumentar neste fim de ano e, com isso, o risco para as gestantes. Segundo ele, o zika é um risco até o final da gravidez, e não só nos primeiros meses. Além disso, a infecção nas gestantes também é possível através do sêmen. Já pelo leite materno, ainda é dúvida.
"Não temos a certeza de que a microcefalia é um problema causado por infecção no início da gravidez. O sêmen é uma porta de entrada para a infecção. Pelo leite materno existe uma possibilidade, mas não há confirmação. Pelo parto, com o contato do sangue da mãe e do bebê, também é uma possibilidade. Dois casos ocorreram na Polinésia", finaliza.
Microcefalia, por Célio Pezza*
Microcefalia é uma doença em que as crianças nascem com a cabeça e o cérebro menores que o normal, influenciando no seu desenvolvimento mental. Aqui no Brasil estamos observando um aumento considerável da doença, em especial, nos estados do Nordeste, e muitos profissionais da saúde têm relacionado esse surto de microcefalia com o Zika vírus, transmitido pelo mosquito Aedes Aegypti, o mesmo transmissor da dengue.
As causas do aumento da doença no Brasil estão caindo sobre o mosquito, enquanto outras, mais prováveis, não estão nem sendo mencionadas, pois contrariam os interesses de grandes empresas. Óbvio que a guerra contra o mosquito é importante e já deveria ter sido feita desde muitos anos atrás, mas o ponto central é: será que o mosquito é o causador das microcefalias?
O geneticista e ambientalista canadense David Suzuki tem alertado que alimentos geneticamente modificados e os agrotóxicos podem aumentar consideravelmente os casos de tumores cancerígenos, Mal de Parkinson, Alzheimer e microcefalias. Dentre esses produtos, o uso sem controle do herbicida 2,4-D (ácido diclorofenoxiacético) e do glifosato (Roundup da Monsanto), podem estar ligados ao surto de microcefalias no Nordeste.
Esse agrotóxico é um dos mais utilizados no Brasil, sendo aplicado nas culturas de arroz, café, cana-de-açúcar, milho, pastagem, soja, sorgo, trigo e outras. Esses produtos são altamente tóxicos e seu uso proibido em países como Dinamarca, Suécia, Noruega e outros.
Importante observar que a presença dos venenos diz respeito igualmente ao campo e à cidade, pois o agrotóxico tem a propriedade de permanecer por muito tempo no ambiente e ser carregado por longas distâncias, pelo vento e pela água. Na verdade, temos uma situação de descontrole pela falta de fiscalização, corrupção, falta de conhecimento e as grandes multinacionais que fabricam esses venenos dominam a mídia e as decisões sobre sua utilização.
Também a ANAC é omissa no tema da pulverização aérea, permitindo que aeronaves particulares pulverizem as plantações sem observar margens de segurança em relação a recursos hídricos e áreas habitadas. Para completar esse quadro temos um enorme contrabando de agrotóxicos proibidos. O médico geneticista e pesquisador argentino, Andrés Carrasco, publicou uma pesquisa científica, em 2009, mostrando sérios efeitos do glifosato na ocorrência do nascimento de bebês com microcefalia e outras deformações.
Infelizmente, esses estudos nunca tiveram o impacto que deveriam e o ser humano continua destruindo de forma acelerada o meio ambiente, sua saúde e as gerações futuras.
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